quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Bairro da Horta do Volong

S. Lázaro, que em tempos idos foi conhecido por Bairro da Horta do Volong e onde, em 1895, a peste dizimou milhares de vidas, abrange uma área mais ou menos limitada pela Calçada do Poço, Caminho dos Artilheiros, Rua de Sanches de Miranda, Estrada do Cemitério e parte da Avenida do Conselheiro Ferreira de Almeida.
«O Bairro da Horta do Volong e os seus arredores não escaparam ao flagelo [em 1895] mais do isso: devia ter sido uma das zonas da cidade mais contaminadas (...). Tornando-se necessário proceder ao saneamento de todo o bairro e seus arredores, o Engº Abreu Nunes apoiado pelo Governador Horta e Costa, promoveu a expropriação de todas as casas de alvenaria daquele bairro e a destruição dos casebres e palhotas, onde criavam à solta, suínos, galináceos, etc.» (P. Manuel Teixeira, Toponímia de Macau, vol. II).
Do Bairro da Horta do Volong ficou o nome numa rua, a Rua do Volong, que começa na Calçada do Poço e termina na Estrada do Cemitério. O Volong que lhe deu o nome foi Francisco Volong, negociante chinês, cristão, que em 1856 obteve a naturalização portuguesa.
A partir do blog Caderno do Oriente de MJ
Que horta era esta?
A resposta está nos "Archivos e Annaes do Extremo-Oriente Portuguez" de 1899, coligidos, coordenados e anotados por J.F. Marques Pereira, 1º Official, chefe de secção, do Ministério da Marinha e Ultramar; Official da Ordem de S. Thiago, do mérito scientiíico, litterario e artistico...
"Precizava o inimigo, para entrar na Cidade, passar ao lado d'um espesso bambual, que lhe ficava á sua direita e perto da porta do campo, bambual de que hoje não restam vestígios, porque sendo destruído em 1791 por Fellipe Lourenço de Mattos, foi depois tornado em horta a qual pertenceu primeiro a D. Rita Bagmond (NR: ou Bagmand ou Backman) e passando em seguida por novas transformações, e novos donos, está hoje aquelle terreno cheio de cazas chinas, propriedade de Francisco Volong, china naturalisado Portuguez. Tendo pois o inimigo de passar ao lado d'este bambual, temeu alguma emboscada, pelo facto de não ver pessoa alguma e estar soffrendo não só os tiros do Monte, como também descargas successivas do lado da Guia; assim mudou de plano, e diligenciou subir ao alto do oiteiro, sobre o qual já existia uma Ermida, mas esta subida lhe foi embaraçada não só pelo fogo com que Cavalinho os atacava, como também pelo que do alto da Ermida lhes fazia Rodrigo Ferreira, que n'aquelle lugar se achava com 8 Portuguezes, 20 filhos do Paiz e seus moços. Cessando o fogo nos navios Hollandezes, e reconhecendo os Capitães que commandavam os Fortes de S. Francisco e Bom-parto, que o inimigo desembarcava, e vinha por terra atacar a Cidade, enviaram a toda a pressa João Soares Vivas com 50 mosqueteiros a defender a entrada, e chegando este soccorro ao campo no momento em que o inimigo tentava tomar o oi- teiro da Guia, unio-se a este auxilio, Lopes Sarmento de Carvalho, encarre- gado da porta da Cidade, e com tal furor atacaram os Hollandezes, que os puzeram em confuzão, e ainda que o Cheffe d'estes soldados tentasse fa- zer frente aos nossos, essa ousadia lhe custou a morte, sendo o inimigo carregado até Cacilhas. A morte de Kornelius causou tal desordem entre os Hollandezes, que estes só procuraram fugir, deixando pelo caminho, armas, correames, tam- bores e bagagens, e apezar de terem ficado em Cacilhas duas companhias de reserva, estas se apoderaram do rnesmo medo e terror de que seus ca- maradas vinham possuídos, e sem pensarem na defeza, trataram apenas de salvar a vida, chegando muitos a atirarem-se ao mar para a nado se esca- parem, tumulto este de que resultou virar-se um dos escaleres e morrerem bastantes, afogados. A' sombra dos Portuguezes, corria desenfreado o povo sobre os fugiti- vos, sem lhes dar quartel, e conta-se que era tal o furor, que até uma Ca- íra matou muitos dos inimigos com um grande espeto, ainda que outros affirmam ter sido com uma alabarda que apanhara no campo. Os Hollandezes perderam entre mortos e prisioneiros, 500 homens; 8 Bandeiras; uma peça; 5 tambores, e muitas armas e bagagens. Estas ar- mas existiram, até irem para Gôa os Jesuítas, no seu convento: depois, ignora-se o destino que tiveram. Do nosso lado, perdemos 4 Portuguezes, 2 Hespanhóes, e alguns escravos, tendo 20 feridos. A Hollanda tomou tal horror a Macao, e tanto medo ao nosso ferro, que apezar de se terem apoderado de quasi todo o Sul e de estar Gôa bem distante, d'onde só podiam vir soccorros mais promptos, não voltou a investilo, ainda que alguém ha que affirma ter sido enviada outra Esquadra a atacar esta Cidade, porém que apanhando um tufão ao entrar nos mares da China, todos os navios que a compunham se perderam. As maravilhas praticadas, por este punhado de homens, principalmente aquelles que nunca abandonaram o seu entrincheiramento, são altameute re- conhecidas, e muito de propósito procurámos saber os nomes d'estes prin- cipaes heroes, para lhes pagarmos, como podemos, o tributo que pelo seu valor e lealdade merecem á nossa memoria, e grata recordação. Esta victoria de nossas armas, que só ajudada pelo favor do Omnipo- tente, poude ser tão completa, deu lugar a um voto feito pelos moradores de então, promettendo ir todos os annos, com o corpo do Senado, á Sé Cathedral render graças a Deus, na véspera de S. João, de cujo voto existe termo no archivo da Camará. Ha duzentos e quarenta annos pois que nem uma só vez tem deixado de se fazer a procissão que vimos na tarde do dia 23, e a festa solemne do dia 24 na Sé Cathedral."

Imagem do que terá sido a primeira construção da Igreja de S. Lázaro

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